Dentre as medidas emergencial para enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da pandemia provocada pelo coronavirus, foi editado a MP 946/2020, que traz em seu artigo 6º a possibilidade de saque do FGTS até o limite de R$ 1.045/00, a partir de 15 de junho de 2020 até 31 de dezembro de 2.020.

Ocorre, entretanto, que a Lei 8036/90, em seu artigo 20, XVI, já previa a possibilidade de movimentação do FGTS mediante “necessidade pessoal cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural”, mediante solicitação de movimentação da conta vinculada no prazo de até 90 dias da publicação do ato de reconhecimento da situação de emergência ou estado de calamidade pública, e em valor de saque máximo a ser definido na forma do regulamento.

O Decreto 5.113/2004 veio regulamentar o disposto no art. 20, XVI, da Lei 8036/90, fixando como limite de saque a quantia correspondente a R$ 6.220,00.

Demonstrado o estado de calamidade pública e a necessidade pessoal do trabalhador, o saque do FGTS é devido até o limite fixado no Decreto 5.113/2004, podendo ser solicitado desde o início do estado de calamidade.

Os prazos e valores trazidos pela MP 946/2020 não se coadunam com e legislação pátria, que destina o FGTS ao trabalhador, e não à Caixa Econômica Federal, muito menos resguardam a proteção à vida.

Nesse sentido bem fundamentou o Juiz Relator Guilherme Guimarães Feliciano, em voto proferido nos autos do Proc. n. 0006397-38.2020.5.15.0000:

“(a) que, na sua tripla natureza, o FGTS tem, para o trabalhador, caráter de salário diferido (v., por todos, SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, passim), pertencendo ao trabalhador e não à Caixa Econômica Federal); (b) que o maior valor constitucional a se preservar, neste momento, é indiscutivelmente o da segurança alimentar (para a subsistência diária) e econômica (para remédios, itens de prevenção – álcool gel, máscaras etc. – e outras necessidades) do trabalhador e de sua família; (…)’

Por força do princípio da legalidade, e pela prevalência da saúde, no confronto dos princípios constitucionais, não pode existir limitação à norma federal existente sobre a matéria, devendo ser aplicado o art. 20, XVI, da Lei 8036/90, em seu integral conteúdo.